terça-feira, junho 16, 2009

Vou Descobrir o Paraíso

Pedro Álvares Cabral (PAC) e Vasco da Gama (GAM) deambulavam pela próspera Lisboa, num domingo soalheiro do Outono de 1499. PAC, ébrio e titubeante, vingava as suas agruras numa garrafa de rum, com os olhos postos nas rameiras que passeavam os seus andrajos à beira Tejo, na esperança que um mamilo mais encalorado lhe sorrisse e lhe ajudasse a passar a tarde. GAM, laureado com honras de Estado após o seu glorioso regresso da Índia, jactante com todo o seu prestígio acumulado, estava só a dar uma caminhada para facilitar a digestão; quando passassem as três horas, iria matar alguma coisa. O quê? O que houvesse à mão suficientemente vivo para morrer. Simples.
Dois espíritos antagónicos, porém dois heróis imortais que se tratavam por tu e que juntos escreveriam páginas brilhantes da antologia lusitana. Encontraram-se ali, mesmo no sítio onde hoje é o Lux.

GAM – Olha quem ele… és tu, man?
PAC – Man? Que é isso, pá?
GAM – Man, és o PAC. O PAC, man!
PAC – F**a-se, ó Vasco, ‘tou com uma ganda bezana, não ‘tou p’ra trocadilhos fatelas. Deixa-me mais é curtir as peixeiras da Ribeira…
GAM – Então, man, qual é? ‘Tá-se mal?
PAC – Eh,pá, ando fo***o com esta merda…
GAM – Então? Arranjaste escorbuto?
PAC – Não, pá.
GAM – Sífilis?
PAC – Essa merda é mais com os paneleiros do século XIX, não.
GAM – Cancro?
PAC – Qu’éssa merda?
GAM – É uma cena bué da má. Ouvi dizer.
PAC – Eh, pá, não é nenhuma doença, ca****o.
GAM – Então?
PAC – Eh pá, é esta merda.
GAM – O quê?
PAC – Este país, pá… Estou farto desta merda. Já não se pode.
GAM – Então mas… alguma coisa em particular?
PAC – Eh, pá, é tudo. Isto está feito sempre para os mesmos. É só pu**s e chulos. A merda dos nobres e da igreja. Não há paciência para tanta merda.
GAM – E o que é que queres fazer?
PAC – Vou bazar. Pá, cheguei ao limite. Isto já não é vida para mim.
GAM – E vais para onde? Flandres?
PAC – Quais Flandres, quais ca****os! Fo**-**, Bélgica, pá? Aquilo é só chuva e gajas gordas e muita brancas… nã, se é para bazar daqui, é para ir curtir um bom bocado.
GAM – Qual é a tua ideia, então?
PAC – Vou descobrir o Brasil, car***o!
GAM – Brasil? Qu’é isso, man?
PAC – Uma terra de gajas muita oferecidas, morenaças e com uns cus enormes. Uma terra onde faz calor todo o ano e onde só apetece andar nu e a f***r do nascer ao pôr-do-sol. Pumba, pumba, pumba! Aquilo é só dançar, comer fruta esquisita e f***r à discrição! Fo**-se, aquela merda é o Paraíso, car***o!
GAM – Fo**-**, como é que existe uma terra dessas?
PAC – ‘Tou-me a cagar; eu é que vou descobrir a terra, eu é que decido como aquela merda vai ser. E aquela merda vai ser uma farra do car***o, ouve o que te digo.
GAM – E isso fica longe?
PAC – É capaz de ficar um bocado… ainda não sei, nunca ninguém foi lá…
GAM – E como é que disseste que se vai chamar?
PAC – Brasil. Vem de “brasa”, que é o que todas gajas são por lá. Umas brasas do car***o. Mal posso esperar para descobrir aquilo. Já tenho tudo pensado. Vou logo comer uma nativa à canzana mal ponha os pés na praia e vou dizer ao Pêro de Caminha, aquele totó que tem a mania que sabe escrever, para descrever a f**a com todos os pormenores, tim-tim por tim-tim, desenhos e tudo, que é para depois a malta ficar a saber como é que são as coisas na terra do PAC. Fico logo com o pau feito só de pensar nesta merda! É do car***o, pá!...
GAM – Man, e como é que se vai lá ter?
PAC – Pá, como é que tu foste para a Índia?
GAM – Ui, man, não vás por aí…
PAC – Diz-me lá, pá, como é foste lá ter com os monhés?
GAM – Pronto, saí de Belém, ‘tás a ver?…
PAC – Sim…
GAM - … caguei no Velho do Restelo e fui em direcção à Madeira, sempre a abrir pela faixa da esquerda…
PAC – Sim…
GAM – …cheguei a Cabo Verde, virei à esquerda…
PAC – Então eu vou para a direita.
GAM – Qu’éque ‘tás a dizer, man? ‘Tás-te a passar, não? P’rá direita não há népia!
PAC – Já decidi. Tem de ser por aí. E assim também posso curtir o calor dos trópicos e ganho uma corzinha na pele, hã, que achas? Que é para me ambientar mais ao Brasil… bem pensado, não?
GAM – Man, pensa lá bem… Não queres vir comigo?
PAC – Eu depois vou lá ter contigo.
GAM – Man, a sério, eu deixo que tu bombardeies Calecut… vem lá comigo e deixa-te dessas merdas…
PAC – Não me fo**s, Vasco! Eu gosto de caril mas não ‘tou para aturar essas merdas! Vai lá para junto dos monhés à vontade e deixa-me com a minha cena!
GAM – Não é isso, PAC, eu só queria que tu…
PAC – Fo**-se, pá! És sempre “tu”, “tu”, “tu” e as tuas cenas! Sempre com essa do “ai, preciso de pimenta para o rei”, “ai, pelo Cabo da Boa Esperança é que é”, “ai, preciso de duas caravelas ou assino por Castela”, “ai, vou rebentar com aquela cidade com os meus canhões”… fo**-se, pá! E eu, car***o?!? E os meus sonhos? As minhas descobertas? A minha vida, pôrra?!? Eu também quero ter uma ponte e um centro comercial com o meu nome! Achas que é a andar atrás de ti que eu vou conseguir alguma coisa de jeito?
GAM – Talvez consigas meter o teu nome numa escola 2+3…
PAC – ‘Tás a ver? Até aquele merdas do Magalhães, pá, o Magalhães!...
GAM – Fo**-se, ganda vendido, esse gajo.
PAC - … o Magalhães, hã?, um porco de primeira… um gajo que não descobre nada, um gajo que se limita a andar às voltas!...Mas tem o nome num computador e o car***o… já viste esta merda, pá? Não é de um gajo se passar?
GAM – Que horas são?
PAC – Sei lá, ó car***o… para aí umas quatro da tarde.
(Vasco da Gama desembainhou a sua espada e fê-la atravessar todo o corpo do transeunte que vinha a passar. Não satisfeito, acendeu o rastilho do seu canhão portátil e destruiu duas embarcações de pesca e alguns casebres ribeirinhos pertença dos pescadores.)
GAM – Desculpa lá, tive de matar alguém e fazer alguns estragos, é recomendação do médico… se não mato alguém de oito em oito horas fico com uma enxaqueca insuportável, nem queiras saber.
PAC – Essa cena é fo***a, pá… o que é que aconteceu da última vez que não mataste alguém?
GAM – Fiquei com uns calores tão danados que rebentei com 50% da população de Moçambique.
PAC – Mais vale matar só um gajo de vez em quando, não é?
GAM – Iá, iá, então não… olha, queres passar lá pelo meu palácio para bebermos um runzito? Já vi que estás bem aviado de rum, mas queres vir?
PAC – Essa é outra… pá, eu vou descobrir uma terra de onde vou trazer cenas para fumar. Beber vai ser só uma parte da diversão. Fumar vai ser a outra parte. Só curtir.
GAM – Fumar?
PAC – Iá, ‘tás a ver? Tipo… pá, lá no meu Brasil vai haver bué dessa cena… não viste lá ninguém na Índia a fumar?
GAM – Não…
PAC – Pá… tens um pauzinho de tabaco que se chama… vamos lá, “cigarro”… aceso na ponta… e depois é chupar e mandar o fumo para fora.
GAM – Ah, estou a ver…
PAC - … e podes fazer rodinhas de fumo com a boca…
GAM – Ah, assim está bem, assim já parece porreiro.
PAC - … e a seguir a fo**r uma brasileira não há nada melhor do que uma cigarrada. Meu, vai ser uma cena altamente. Vai ser bué da cool fumar.
GAM – Estás cá com umas ideias… Não sei, não, man; até hoje nunca tinha ouvido ninguém dizer “cool” sem ser acusado de heresia… devias ir curar essa bebedeira antes…
PAC – Qual quê! Estou mais decidido que nunca. Não passa do próximo ano! Vais ver!
GAM – Pronto, man, pronto, são as tuas cenas, faz lá as tuas cenas…
PAC - … e que fique aqui registado: como símbolo da terra que eu vou descobrir, daqui a cinco séculos há-de estar aqui, neste sítio…
GAM - … neste sítio?
PAC - …pá, rigorosamente onde eu estou, ´tás a ver?; vai estar uma ganda casa de diversão nocturna com uma entrada que vai ser uma gaja de pernas abertas, ‘tás a ouvir?
GAM – Pfff, man… não acredito. Nem daqui a cinco séculos.
PAC – Meu, a maior casa de diversão nocturna de toda a Lisboa, ‘tás a ver?! Quem cá não entrar não é gente não é nada! E duas gandas pernas abertas, que é para um gajo entrar pela c**a e nunca mais querer sair daqui!... Beber, fo**r e fumar, beber, fo**r e fumar… Meu, eu vou descobrir o Brasil dê por onde der.
GAM – E tu acreditas que vai ser possível encontrar um paraíso assim?
PAC – Pá, meu, ouve; é tão certo como o Diogo Cão ser rafeiro.