sexta-feira, julho 31, 2009

Repórter Rap-Estrábico

- Yo.
- Hã?
- Yo.
- O quê?
- Uhn-uhn, yo, estou na área a bombar, sempre a rappar, MC está no ar, as questões vão rebentar, yo, uhn-uhn, bring it on.
- Ó filho, eu tenho fome, sou um sem-abrigo, não percebo nada de coisas estrangeiras… eu só queria um cobertor e uma carcaça… tem uma moedinha?
- Iá, iá, ‘tou aqui a representar a minha crew, e vou mandar uns pontapés no cu, a esses senhores eu digo «o rei vai nu», desigualdades e tristeza, por todo o lado com muita certeza, há que denunciar esta pobreza, se és pobre não vais conseguir papar a Teresa, uhn-uhn, oh yeah, uhn-uhn, fuck da cops.
- A Teresa?
- Minha dama, yooo, pra ir prá cama, yeeeah, não vás por esse lado, meu desdentado, ela curte bué os dreads, tu pra ela não serves, não tens cenário e cheiras mal, pareces um animal, é a injustiçaaaa, da políciaaaa, yooo, há que contestar, há que graffittar, MC está na rua para dizer as verdades, se não sabias agora tu já sabes, yo.
- Eu pensava que você estava aqui para fazer uma reportagem sobre as difíceis condições de vida de um desamparado como eu… o que até é porreiro, dado que os jornalistas costumam dar-me comida e uns trocos que me ajudam bastante…
- Iá, iá, sempre a representar, sempre a rimar, língua de fogo que não vai parar, as consciências a abalar, o político vai abanar, com as palavras sempre a bombar, como o Shaquille a afundar, o people da rua vai atacar, uhn-uhn, e tu vais sentir o pitbull a morder, yeah, o edifício vai tremer, yo, o povo quer comer, hã, e o MC está aqui para defender, yooooo.
- Qual é a pergunta, afinal?
- BEATBOX: chpuc, chpac, ch-ch-chpuc, chpac, chpuc, wingawingawinga, chpuc, chpac, ch-ch-chpuc, dzoimdzoimdzoim, chpuc, chpac, chpuc, chpac, wingawingawinga…
- Dói-lhe a garganta? Precisa de uma pastilha?
- Yo, é só sair à rua, é a realidade crua, é a evidência nua, o povo tem fome, e há pessoal que só come, políticos sem vergonha, é sempre a mesma ronha, como se pode viver, hã, sem à Internet aceder, yo, eu acabei de entrar no site, yeah, e comprei uns ténis da Nike, hã, mas este pessoal está a desatinar, e a crew com boas roupas a representar, mas quem é põe um fim a isto, yo, e eu sem os meus fios de ouro não existo, hã, e MC está a pensar, numa ganda rima pra rebentar, yo.
- Não percebo…
- Sócio, preciso de uma palavra que rime com "sem-abrigo".
- O quê?
- F**a-se ó sócio, manda lá uma palavra que rime com “sem-abrigo” senão começo a aparvalhar… um minuto a falar sem rimar e começo a flipar… viste? Não sou capaz. Quando dou pela cena, é logo “zás!”. Viste? Outra vez.
- Sei lá… Eu não percebo nada disso…
- F**a-se man! Bem mereces a vida de merda que levas!... Não me ajudas nada, car***o! Vá lá, lembra-te lá de uma palavra que rime com “sem-abrigo”… estou com uma branca!
- Vocês só se dão com as brancas, eu bem vos vejo a passar por aí…
- ‘Tás a tripar, sócio? Tás a tripar comigo? Chino-te já aqui!
- Calma, afaste lá isso, isso é perigoso!
- É isso! É isso! Ganda chouriço! Está a vir, yo, está a subir, yeah, rima do MC para toda a crew curtir, hã, aqui vai para partir, check it out, só quem é sem-abrigo, é que conhece o perigo, a valer, hã, a doer, yo, isto não é para meninos, isto não é para rabinos, yo, isto é para malta da street, e aquela dama bem que fazia um strip, yeah, mas não há tempo a perder, yo, tenho uma parede pra escrever, yeah, e a minha poesia é como sangue a escorrer, nas mentes mais retrógradas que pode haver, a deslizar como o meu pau na vaselina, a incendiar como se fosse gasolina, e agora os betinhos ficaram sem saídas, vamos sacar-lhes as roupas da Adidas, yo, yeah, comin’ up.
- Ainda não consegui perceber nenhuma pergunta…
- Iá, iá, a malta é só style, gosta de dar baile, na rua a desbundar, as damas a galar, o tuning a bombar, cenas bacanas a tatuar, yo, no pescoço, quando há caroço, yeah, está a ganza a rodar, para os putos que se estão a cagar, prá sociedade, yeah, é a verdade, yo, merda de sistema que não nos dá iPhone, yo, ando com um telélé que parece um trombone, yo, não há direito, não há respeito, eu quero sair de Chelas e viver a preceito, quero avacalhar sempre sempre a eito, yeah, e esta é para a minha mãe ouvir, é em casa que a minha dama vai parir, vou ser pai sem temores, e o puto vai viver como se fosse de doutores, sem dores, com flores, hã, ali no shopping a controlar, porque há bué da cenas pra gamar, sejam novos ou sejam velhos, há que ficar com os aparelhos, hã, e se serve também para ti, quero tudo o que seja Sony, e vai ser um momento zen, quando abro um Citröen, yo, Sam The Kid está no ar, o poeta popular, sempre a representar, ganda cena é espectacular, bring it, bring it on.
- Olhe, eu não estou a perceber nada… vou responder aquilo que tenho respondido aos seus colegas: eu vivo aqui em cima deste contraplacado desde o mês passado… mas já vivo na rua há alguns anos… tudo começou quando…
- Uhn-uhn, nem me digas nada cota, sai da minha rota, minha vida não vais compreender, eu é que sei o que é mesmo sofrer, hã, minha dama com 15 anos foi engravidar, e eu então tive que ir para a rua gamar, professores que não ensinam, yo, é como se fossem raps que não rimam, yeah, eles só falam de coisas parcas, e nós queremos é material de marcas, caguei prá disciplina, eu parei na plasticina, era muito prá minha mona, então eu bazei prá minha zona, foi sofrer a bom sofrer, não havia ganza pra vender, people a enlouquecer, foi prá rua disparar, na bófia que ia a passar, hã, e chamaram-lhes racistas com razão, porque a nós ninguém nos pode dizer não, e se não concordas ficas a dever-me uma, pode ser aqueles bonés da Puma, yo, yeah, beatbox in da house: chibum, chibá, chibumchibumchibá, chibum, chibá, chibumchibumchibá, wekowekoweko, bring it on.
- Eh pá, mas você diz que faz isto e faz aquilo, sofre disto e sofre daqueloutro… mas vamos ver… e você não faz nada! Só ameaça em forma de rima forçada! E ainda por cima vive como um rei! Olhe lá para essas roupas, esse carro, esse telefone que faz música… Vive bem melhor que eu! E, ainda por cima, não me ajuda!
- Man, não estás dentro da cena, tens a mente pequena, uhn-uhn, estou a ajudar, com rimas pró ar, consciências a despertar, bla-bla-bla-ar, não ‘tás a entender, não ‘tás a desenvolver, agora ficas a ver, man, fica bem, man, MC representou dos zero aos cem, man. Yo, props, props, agora vou ali controlar a dama, não tarda nada ‘tou com ela na mama, lá no gueto, é pró espeto, yo, a vida é dura, não há cura, somos rejeitados à nascença, não gostamos do Olegário Benquerença, ouvi dizer que política e corrupção, são dedos da mesma mão, são capazes de ter razão, eu não vou dizer que não, yeah, acho que nem sei quem são, yeah, porque eu tenho as calças quase no chão, já que em cenas de estilo eu dou-te uma lição, e eu sei que fico bué da volátil, quando ando na street sem o meu portátil, uhn-uhn, yeah, vou continuar a acusar que vocês são todos racistas, enquanto faço os possíveis para aparecer na capa das revistas, yo, e vocês ajoelham-se porque são uns totós, yeah, enquanto nós é que andamos com gandas popós, yeah, e podes crer que vamos estar sempre contra, a partir e pilhar cenas da montra, uhn-uhn, é tentar curtir como se pode, enquanto é sempre o outro que se fo*e, yo, temos pena, temos pena, mas o rap é a minha cena, mad nigga playin off da house, check it out.
- Vá lá salvar a sua dama, então… Ei! O meu contraplacado? Roubaram-me o contraplacado! Seus pulhas! Era o contraplacado mais suave em que alguma vez raspei os meus calos!… chuif…

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