segunda-feira, novembro 20, 2006

O Teu Clube!

Imaginem um clube homónimo de massas alimentícias que se dizem boas. Coloquem esse clube numa ilha e, dentro dessa ilha, numa encosta nebulosa com vista para o mar imenso. Nessa encosta, aproveitem o mais curto espaço disponível para desenhar um campo de futebol, tão curto, tão curto, que só haverá espaço para uma bancada e três muros de cimento a ladear o rectângulo de jogo (pelo menos, enquanto as necessárias obras de beneficiação não terminam). Para finalizar, as pièces de résistance: uma bizarra claque histérica feminina (perdoem-me o pleonasmo) e um presidente aprendiz do inesquecível João Vale e Azevedo.
Muitos de vós (os dois ou três) que estão a ler este texto já descobriram, decerto, este enigma que nem chega a sê-lo: falamos do Clube Desportivo Nacional, Nacional da Madeira, como será melhor conhecido.
Este é um clube insular, talvez demasiado insular. Na equipa de futebol, pontificam nomes que pouco corroboram o “nacional” que, enganadoramente, ostentam no nome. Juliano Spadaccio (que ia dando na tromba a um dirigente… do seu próprio clube! – um caso actual a acompanhar), o ríspido Ávalos, o desconhecido Rafael Bracali, o durinho Cléber, Chi-Chi-Chilikov, o relógio suíço que é Diego Benaglio, o evoluído Marchant (não de arte),… enfim, um onze pouco “nacional”, mas que tem vindo a recuperar paulatinamente alguma portugalidade através de nomes como Bruno Amaro, Ricardo Pateiro, Patacas e o já saudoso Nuno Carrapato. Longe vão os tempos dum Sylvanus, Murphy, Gilmar, Leiz, William, Heitor, Dino, Serginho Baiano, nomes que tornavam o CD Nacional um dos maiores viveiros de brasileiros do nosso campeonato. Essa honra cabe hoje ao rival Marítimo, que, imitando as grandes constelações galácticas do Velho Continente, poderá muito bem entrar em campo sem um único jogador nascido no país do campeonato onde joga. Sim, a tradição já nem sequer existe para ainda poder ser o que era.
O clube é assaz pitoresco, como podemos constatar no paradoxo da nomenclatura acima exposto, encontrando ainda mais paralelismos com a América Latina.
Por exemplo, o seu actual presidente, no cargo há 12 anos. O CD Nacional sempre foi um clube relativamente estável e sem grandes disputas de poder, como atestam os apenas 14 presidentes nos 96 respeitosos anos de História (mandatos médios de quase 7 anos), mas este Presidente parece apostar em derrubar recordes de estabilidade. Para além duma modéstia fora do comum, que fez com que baptizasse o estádio (?) do seu clube com o seu próprio nome, o estilo intempestivo com que intervém publicamente é claramente decalcado dum qualquer chefe de guerrilha sul-americano (ou Alberto João Jardim, se não quisermos ir tão longe). Ele simplesmente não encontra dificuldades em absorver qualquer disputa de poder interna… se é que ela existe. Este senhor projectou com a sua vaidade pessoal, o gel no cabelo e os indissociáveis óculos escuros da moda o nome do CD Nacional até às competições europeias de futebol por duas ocasiões recentes. Presenças europeias que, contudo, não passaram de viagens pouco mais que turísticas a Espanha e à Roménia. Pessoalmente, e sempre que pode, lança a confusão como Jesus lança comida aos pobres, na Liga de Clubes ou na forma ousada de resgatar reforços que eram virtualmente de outros clubes para o seu emblema.
Este Engenheiro, apodo do qual nunca se separa, como forma de manifestar a validade das suas opiniões e actos, chegou a comparar o grandeza do seu clube a um outro clube de natureza, essa sim, nacional (e até internacional), na época passada. Deu-se mal e a partir daí retraiu-se um pouco… mas, lá no fundo, só aguarda por uma próxima oportunidade para sobressair – deixem o CD Nacional ganhar uns jogos e ele lá aparecerá, ufano de si mesmo.
Bem, se calhar o facto do presidente em exercício do clube emprestar o seu nome ao estádio (??) nem é assim algo de tão extraordinário – Avelino Ferreira Torres, no Marco de Canavezes e Vieira de Carvalho, na Maia, salvaguardando as distâncias que, presumimos, existam, abraçavam situações com muitas semelhanças. Se calhar vale mais a pena recordar o vazio directivo que assolou o CD Nacional durante 6 anos, entre 1948 e 1954 – o clube não teve presidente, segundo informações oficiais, que nem sequer confirmam a existência duma Comissão Directiva! Isto é, viveu completamente à deriva. Foram tempos difíceis? Imaginamos que sim. Mas se calhar com lideranças mais honradas do que a presente.
Não nos podemos esquecer que o CD Nacional, na sua grandeza virgiliana e homérica que o Engenheiro presidente assegura que tem, apenas ingressou nos campeonatos nacionais de futebol em 1975, isto é, lá perto das suas bodas de diamante. Portanto, o relativo sucesso é recente e até aquém do verificado pelo rival Marítimo. É um clube jovem nas caminhadas do estrelato da Primeira Liga e aberto às excentricidades características da juventude. Aqui entra a claque feminina, verdadeira particularidade alvi-negra.
Seja pelos cânticos honestos ou pelas vozes irritantemente esganiçadas atrás do banco forasteiro, estas senhoras marcam uma época nos anais das claques em Portugal e, arriscamo-nos, no mundo. As bravas mulheres adeptas do CD Nacional não regateiam esforços no gritar e no aborrecer treinadores visitantes. Coadjuvadas por outros grupos de apoio de menor singularidade, apoiam-se em versões musicais “nacionalizadas” doutras claques e na sirene de ambulância que é já um marco no apoio desportivo português, suplantando os bombos de Caxinas e o trompete do Dragão. Pontapé de canto contra o CD Nacional é garantia do som de ambulância a ecoar pelo betão que ladeia o relvado. Um bom som, refira-se, capaz de assustar qualquer maqueiro desprevenido.
Não lhes perdoamos é o desplante com que colam na parede de cimento da superior norte do estádio (???) a superior arrogância: “Nacional – o Teu Clube”. Por que raio haveria de ser? Rai’s partam as confianças!... Ainda bem que elas não vêm para o Continente, limitando os seus guinchos à exígua Choupana.

2 comentários:

. disse...

Realmente quem vá à Choupana até é capaz de ter o Nacional como clube. Engraçado é a forma, percebo agora, como eles tomam isso como um "apodo" estado-novista ao clube.

. disse...

«...uma bizarra claque histérica feminina (perdoem-me o pleonasmo)...»

UI