Sala de aula.
Estão presentes dois alunos de uma turma originalmente constituída por mais de uma dúzia.
A maioria opta, compreensivelmente, por não frequentar as aulas: ainda não chegou ao fim do novo jogo para a Playstation e jogar naquela sala desprovida de posters de artistas gay nas paredes e sem colunas de som ligadas no máximo é, no mínimo, chato, para não dizer cruel.
Chega a ser penoso, porque é necessário suportar todo aquele frio e apoiar o fundo das costas naquelas cadeiras desconfortáveis. Onde se está bem é em casa; aí, sempre se vão mandando mensagens SMS, MMS, MSN, SSS, TMN, GMT, TripleX e outras que tais com maior tranquilidade.
Um desses alunos parece estar adormecido, mas também pode estar extremamente drogado. Ou mesmo em estado comatoso, dada a baba que escorre pelo canto da boca. Já ninguém ouve a voz dele desde o 3º dia de aulas, mas, apesar de tudo, é o melhor aluno da turma à conta da sua estranha e passiva assiduidade. É o Evaristo.
A outra aluna está preocupada com a sua ovulação e masca compulsivamente uma pastilha elástica, dada a falta das unhas que já não tem. É hiperactiva e mexe-se muito: na cadeira, no cabelo, no telemóvel, no clitóris; enfim, o respectivo encarregado de educação prometeu que, a partir de terça-feira, ela passaria a vir às aulas vestida com uma camisa-de-forças – para evitar que ela tenha mais orgasmos sonoros que perturbem o decorrer das lições e que irritem os cães das redondezas. É a Arlete.
Um terceiro aluno chega cerca de meia-hora depois da aula de 45 minutos ter iniciado. Não parece muito bem-disposto, pela forma pouco simpática com que empurrou a cabeça do Evaristo contra o tampo da mesa e pontapeou umas quantas cadeiras que nem sequer estavam perto do lugar onde se sentou, lá no fim da sala, mesmo com vários lugares disponíveis mais à frente. Acendeu um cigarro com a ponta do cigarro que vinha a fumar e arremessou com imensa pontaria essa ponta para dentro do estojo da Arlete, que estava a mastigar uma borracha e até se engasgou. Felizmente, a cerveja que estava dentro do estojo apagou imediatamente a beata. Este aluno é o Policarpo.
O professor faz a introdução de um novo tema.
- Neste tempo que resta da aula, vamos aprender um novo tempo verbal.
Policarpo sente-se injustiçado e reclama.
- Aprender? Mas que m***a é esta? Então e os bonecos de plasticina?
- Policarpo, penso que aos 15 anos, e mesmo considerando que estamos na 3ª classe, esse tipo de material já não constitui a pedagogia mais adequada para ti.
- Ca****o mais à pedofilia!
- Pedagogia, eu referi-me à pedagogia – corrige o professor, com muita calma.
Policarpo, um pequeno facínora eufemisticamente descrito na imprensa como “um jovem com problemas sócio-económicos, de sangue na guelra e com uma imaginação muito fértil”, não aguenta o desaforo.
- F***-se mais essa m***a, ó car***o! Estou-me a passar contigo, ó c***ão! Cala-te mas é!
- Pronto, Policarpo, pronto… Podes então fazer uns desenhos com lápis de cera, está bem?
- Bah! Lápis de cera… Vou mas é fazer uma ganza! Tens filtros, meu?
- Filtros?
- Sim, uma beca de cartão… caga nisso. Ó vaca – dirigindo-se a Arlete – orienta aí o teu cartão de eleitor para fazer um filtro.
Arlete fica atarantada.
- Cartão de eleitor? Cartão de eleitor? Meu, acho que já o usaste todo… Não tenho filtros, pá, não tenho filtros – entretanto, toca o seu telemóvel.
Policarpo desconfia.
- Bem, ó c**a de sabão, se é aquele m***as do Bairro dos Alguidares a mandar-te mensagens outra vez, tens de te haver comigo!
- Não é, Poli, não é! É o meu irmão, juro-te que é o meu irmão!
- Ai o ca****o, o teu irmão está na choldra, por que raio é que te está a mandar mensagens? Não me f**as, ‘tás a ouvir? Vou-te aos cornos se tiver que ser!
- Não era esse, era o meu outro irmão, Poli. Tem calma, tem calma, não me faças mal!
- Se me estás a mentir e andas a fazer br***es aos gajos do Bairro eu juro que mando o teu puto pelo cano de esgoto, ‘tás a ouvir? Tal como fiz com o teu outro filho!
O professor intervém.
- Policarpo, esse não é o modo correcto de tratar uma colega, que ainda por cima é mãe solteira. Porta-te bem.
Aquele pedido de contenção faz saltar a tampa de Policarpo, que até aí tinha estado bem mais moderado do que era usual.
- C’um ca****o! Vou f***r a tua cara toda, meu c***ão! Que é para aprenderes a não te meteres comigo!
Policarpo avança destemido em direcção ao professor, arregaçando as mangas e colocando o capuz do seu casaco na cabeça. Este é o sinal indicativo do início do ataque, bem reconhecido pelo professor. O professor fica assustado, paralisado, tremendo de pavor.
- N-n-não, Poli! Por favor!...
- Que é que me chamastes? Poli? Mas quem é que te deu essas confianças, ca****o?!
Palavras não eram ditas, dispara um violento pontapé que acerta em cheio no abdómen do professor. Este, instintivamente, dobra-se para a frente e, ajoelhado no chão, pedindo perdão, “Desculpa, Policarpo, desculpa!”, é vítima de mais umas duas joelhadas na testa. Já deitado completamente no chão e com um golpe no sobrolho, é avisado por Policarpo, que lhe agarra nos colarinhos e o puxa para si.
- Estás a ver, ca****o? Para a próxima nem sequer te aviso… és corrido logo à naifada, tal como o gajo que veio antes de ti. Já agora, arranja-me uns trocos!
O professor, combalido, sangrando, parece negar esta última pretensão.
- Aiii… não tenho nada, Policarpo, não tenho nada… só tenho uns quantos cêntimos na carteira, que hoje fui pagar a renda da casa… Por favor…
- Ai o ca****o!... Tudo o que tiveres na carteira é meu! E se tiveres mais do que dizes, estás fo***o comigo!
Policarpo saca a carteira do professor, deixando tombá-lo desamparado no chão. Efectivamente, o porta-moedas apenas contém duas moedas, que Policarpo julga perfazerem 40 cêntimos – embora, na verdade, sejam 60, mas Policarpo ainda só sabe contar até 20.
Todavia, debaixo da fotografia dos filhos do professor, Policarpo descobre uma nota de 10 euros enrolada.
- F***-se, és mesmo um mentiroso do ca****o! Estes já cá cantam – rosna Policarpo, enquanto guarda a nota no bolso do lado menos rasgado das suas largas calças de ganga.
Com mais dinheiro para comprar barras de haxixe, nem por isso Policarpo fica muito satisfeito: ele não gostou que o professor lhe tivesse prestado uma informação falsa. E retalia como consequência.
- Isto assim não pode ser, ca****o! Que me**a é esta, um prof a mentir aos alunos? Mas quem é que tu pensas que és, ca****o?! Vou mas é chamar os meus pais, já vais ver como elas te doem!
Ainda o professor tentava levantar-se para, pelo menos, tentar recompor-se e tratar do seu ferimento e já Policarpo ligava para os pais. Dorido e apoiado na sua secretária completamente graffittada e lascada, o professor ouve uns sons esbaforidos do outro lado do telemóvel. Policarpo termina a chamada e assegura o professor.
- Eles já vêm aí. Isto não pode ficar assim. Vais aprender a respeitar os alunos, ‘tás a ouvir?
Olhando com raiva para o professor que tenta estancar a sua hemorragia, Policarpo aplica mais um soco no tutor, fazendo-o tombar de rabo no chão.
- Aguenta-te aí, ó porco!
O professor lamenta-se, olhos humedecidos pela dor, não apresentando resistência – senão as coisas poderiam ser piores. Por exemplo, ainda podia ir preso por levantar um dedo a um aluno, que, como se sabe, é uma heresia pior do que queimar um exemplar do Corão, com uma mulher nua ao lado, perante uma horda de muçulmanos em Meca e em pleno Ramadão.
Arlete não deu muita importância a este desaguisado, entretida que estava a mandar mensagens via telemóvel com uma mão e a pintar as paredes com spray com outra. Ainda deu uma risada com este último soco, mas não se notou muito, porque se Arlete se rir muito o piercing que ela tem no lábio rasga-lhe a boca toca.
Evaristo ainda estava sentado, com cabeça voltada para baixo em cima da mesa, boiando numa piscina de baba. Certamente que não deu por nada.
(continua)
Estão presentes dois alunos de uma turma originalmente constituída por mais de uma dúzia.
A maioria opta, compreensivelmente, por não frequentar as aulas: ainda não chegou ao fim do novo jogo para a Playstation e jogar naquela sala desprovida de posters de artistas gay nas paredes e sem colunas de som ligadas no máximo é, no mínimo, chato, para não dizer cruel.
Chega a ser penoso, porque é necessário suportar todo aquele frio e apoiar o fundo das costas naquelas cadeiras desconfortáveis. Onde se está bem é em casa; aí, sempre se vão mandando mensagens SMS, MMS, MSN, SSS, TMN, GMT, TripleX e outras que tais com maior tranquilidade.
Um desses alunos parece estar adormecido, mas também pode estar extremamente drogado. Ou mesmo em estado comatoso, dada a baba que escorre pelo canto da boca. Já ninguém ouve a voz dele desde o 3º dia de aulas, mas, apesar de tudo, é o melhor aluno da turma à conta da sua estranha e passiva assiduidade. É o Evaristo.
A outra aluna está preocupada com a sua ovulação e masca compulsivamente uma pastilha elástica, dada a falta das unhas que já não tem. É hiperactiva e mexe-se muito: na cadeira, no cabelo, no telemóvel, no clitóris; enfim, o respectivo encarregado de educação prometeu que, a partir de terça-feira, ela passaria a vir às aulas vestida com uma camisa-de-forças – para evitar que ela tenha mais orgasmos sonoros que perturbem o decorrer das lições e que irritem os cães das redondezas. É a Arlete.
Um terceiro aluno chega cerca de meia-hora depois da aula de 45 minutos ter iniciado. Não parece muito bem-disposto, pela forma pouco simpática com que empurrou a cabeça do Evaristo contra o tampo da mesa e pontapeou umas quantas cadeiras que nem sequer estavam perto do lugar onde se sentou, lá no fim da sala, mesmo com vários lugares disponíveis mais à frente. Acendeu um cigarro com a ponta do cigarro que vinha a fumar e arremessou com imensa pontaria essa ponta para dentro do estojo da Arlete, que estava a mastigar uma borracha e até se engasgou. Felizmente, a cerveja que estava dentro do estojo apagou imediatamente a beata. Este aluno é o Policarpo.
O professor faz a introdução de um novo tema.
- Neste tempo que resta da aula, vamos aprender um novo tempo verbal.
Policarpo sente-se injustiçado e reclama.
- Aprender? Mas que m***a é esta? Então e os bonecos de plasticina?
- Policarpo, penso que aos 15 anos, e mesmo considerando que estamos na 3ª classe, esse tipo de material já não constitui a pedagogia mais adequada para ti.
- Ca****o mais à pedofilia!
- Pedagogia, eu referi-me à pedagogia – corrige o professor, com muita calma.
Policarpo, um pequeno facínora eufemisticamente descrito na imprensa como “um jovem com problemas sócio-económicos, de sangue na guelra e com uma imaginação muito fértil”, não aguenta o desaforo.
- F***-se mais essa m***a, ó car***o! Estou-me a passar contigo, ó c***ão! Cala-te mas é!
- Pronto, Policarpo, pronto… Podes então fazer uns desenhos com lápis de cera, está bem?
- Bah! Lápis de cera… Vou mas é fazer uma ganza! Tens filtros, meu?
- Filtros?
- Sim, uma beca de cartão… caga nisso. Ó vaca – dirigindo-se a Arlete – orienta aí o teu cartão de eleitor para fazer um filtro.
Arlete fica atarantada.
- Cartão de eleitor? Cartão de eleitor? Meu, acho que já o usaste todo… Não tenho filtros, pá, não tenho filtros – entretanto, toca o seu telemóvel.
Policarpo desconfia.
- Bem, ó c**a de sabão, se é aquele m***as do Bairro dos Alguidares a mandar-te mensagens outra vez, tens de te haver comigo!
- Não é, Poli, não é! É o meu irmão, juro-te que é o meu irmão!
- Ai o ca****o, o teu irmão está na choldra, por que raio é que te está a mandar mensagens? Não me f**as, ‘tás a ouvir? Vou-te aos cornos se tiver que ser!
- Não era esse, era o meu outro irmão, Poli. Tem calma, tem calma, não me faças mal!
- Se me estás a mentir e andas a fazer br***es aos gajos do Bairro eu juro que mando o teu puto pelo cano de esgoto, ‘tás a ouvir? Tal como fiz com o teu outro filho!
O professor intervém.
- Policarpo, esse não é o modo correcto de tratar uma colega, que ainda por cima é mãe solteira. Porta-te bem.
Aquele pedido de contenção faz saltar a tampa de Policarpo, que até aí tinha estado bem mais moderado do que era usual.
- C’um ca****o! Vou f***r a tua cara toda, meu c***ão! Que é para aprenderes a não te meteres comigo!
Policarpo avança destemido em direcção ao professor, arregaçando as mangas e colocando o capuz do seu casaco na cabeça. Este é o sinal indicativo do início do ataque, bem reconhecido pelo professor. O professor fica assustado, paralisado, tremendo de pavor.
- N-n-não, Poli! Por favor!...
- Que é que me chamastes? Poli? Mas quem é que te deu essas confianças, ca****o?!
Palavras não eram ditas, dispara um violento pontapé que acerta em cheio no abdómen do professor. Este, instintivamente, dobra-se para a frente e, ajoelhado no chão, pedindo perdão, “Desculpa, Policarpo, desculpa!”, é vítima de mais umas duas joelhadas na testa. Já deitado completamente no chão e com um golpe no sobrolho, é avisado por Policarpo, que lhe agarra nos colarinhos e o puxa para si.
- Estás a ver, ca****o? Para a próxima nem sequer te aviso… és corrido logo à naifada, tal como o gajo que veio antes de ti. Já agora, arranja-me uns trocos!
O professor, combalido, sangrando, parece negar esta última pretensão.
- Aiii… não tenho nada, Policarpo, não tenho nada… só tenho uns quantos cêntimos na carteira, que hoje fui pagar a renda da casa… Por favor…
- Ai o ca****o!... Tudo o que tiveres na carteira é meu! E se tiveres mais do que dizes, estás fo***o comigo!
Policarpo saca a carteira do professor, deixando tombá-lo desamparado no chão. Efectivamente, o porta-moedas apenas contém duas moedas, que Policarpo julga perfazerem 40 cêntimos – embora, na verdade, sejam 60, mas Policarpo ainda só sabe contar até 20.
Todavia, debaixo da fotografia dos filhos do professor, Policarpo descobre uma nota de 10 euros enrolada.
- F***-se, és mesmo um mentiroso do ca****o! Estes já cá cantam – rosna Policarpo, enquanto guarda a nota no bolso do lado menos rasgado das suas largas calças de ganga.
Com mais dinheiro para comprar barras de haxixe, nem por isso Policarpo fica muito satisfeito: ele não gostou que o professor lhe tivesse prestado uma informação falsa. E retalia como consequência.
- Isto assim não pode ser, ca****o! Que me**a é esta, um prof a mentir aos alunos? Mas quem é que tu pensas que és, ca****o?! Vou mas é chamar os meus pais, já vais ver como elas te doem!
Ainda o professor tentava levantar-se para, pelo menos, tentar recompor-se e tratar do seu ferimento e já Policarpo ligava para os pais. Dorido e apoiado na sua secretária completamente graffittada e lascada, o professor ouve uns sons esbaforidos do outro lado do telemóvel. Policarpo termina a chamada e assegura o professor.
- Eles já vêm aí. Isto não pode ficar assim. Vais aprender a respeitar os alunos, ‘tás a ouvir?
Olhando com raiva para o professor que tenta estancar a sua hemorragia, Policarpo aplica mais um soco no tutor, fazendo-o tombar de rabo no chão.
- Aguenta-te aí, ó porco!
O professor lamenta-se, olhos humedecidos pela dor, não apresentando resistência – senão as coisas poderiam ser piores. Por exemplo, ainda podia ir preso por levantar um dedo a um aluno, que, como se sabe, é uma heresia pior do que queimar um exemplar do Corão, com uma mulher nua ao lado, perante uma horda de muçulmanos em Meca e em pleno Ramadão.
Arlete não deu muita importância a este desaguisado, entretida que estava a mandar mensagens via telemóvel com uma mão e a pintar as paredes com spray com outra. Ainda deu uma risada com este último soco, mas não se notou muito, porque se Arlete se rir muito o piercing que ela tem no lábio rasga-lhe a boca toca.
Evaristo ainda estava sentado, com cabeça voltada para baixo em cima da mesa, boiando numa piscina de baba. Certamente que não deu por nada.
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