segunda-feira, agosto 07, 2006

Pastilhas Elásticas


Perguntei-lhe o que ela achara do meu amigo.
- Não tem estilo – respondeu, taxativa, soprando um balão volumoso de uma pastilha de morango.
A resposta não foi assim tão simples quanto parecera. Ela quis dizer muitas coisas.
Não ter estilo significa não dar nas vistas. Não serve.
Não dar nas vistas significa ser mais um indivíduo incógnito na multidão. Não serve.
Um indivíduo incógnito na multidão não é comentado por ninguém. Não serve.
Quem não é objecto de comentário não satisfaz os desejos de protagonismo. Não serve.
Quem não detém protagonismo não está talhado para liderar nem para transmitir segurança. Não serve.
Aquele que não transmite segurança não agrada a uma mulher, não lhe preenche uma das essenciais qualidades exigidas. Não serve.
Se não agrada a uma mulher, bem que pode desaparecer que não faz cá falta.
Não interessa se o indivíduo em causa pudesse andar camuflado para evitar que pensem que ele tem estilo, que dá nas vistas, que é altamente comentado, que é um líder cheio de segurança e que agrada, e de que maneira, à sua mulher – ele até podia ser o gajo da telenovela ou o gajo do Nobel. Mas como não houve aquele “click” inicial decorrente da primeira impressão superficial, então ele perdeu-se pelo escoador da memória, foi efectivamente mais um anónimo que raiou as pestanas maquilhadas dela sem deixar marcas.
- Não há segunda oportunidade para causar uma boa primeira impressão – ela lembrou-me essa fatídica frase feita, fazendo-me ver que estava perante mais uma adepta do instantâneo, uma indefectível do café solúvel em água, uma aficcionada do sabor fugaz das pastilhas elásticas, coleccionadora de fotografias à la minuta. Para ela, segundas oportunidades, óperas intermináveis, esperas superiores a cinco segundos, tudo o que não tivesse o rótulo de novo, fresco e limpo, era simplesmente insuportável, antiquado, merecedor de desprezo.
Ela adora o gajo do Lamborghini amarelo filho do industrial dos sofás, o tal que muda de penteado todas as semanas e que frequenta o solário de forma a passear as suas diversas tatuagens, esse que apareceu no anúncio dos iogurtes e que mora, diz-se muito por aí, num condomínio fechado lá para os lados do Guincho.
- Esse gajo, sim, tem estilo – comentou com os olhos a brilhar, expelindo novo balão gigantesco pela boca.
Furei-lhe o balão na cara, deixando-a totalmente coberta de pastilha. Ela não achou graça.
- Devias ver o teu estilo agora – ironizei. Nesse momento, passei a ser mais um “parvalhão sem graça”. Entenda-se, “sem estilo”; são tudo variações sobre o mesmo tema.
Podia começar a ler mais revistas sociais, ir aos mesmos sítios de toda a gente e vestir a marca da moda, a ver se aprendo alguma coisa sobre a evolução da sociedade contemporânea. É que, por este andar, tornar-me-ei especialista em rebentar balões na cara de mulheres iludidas.

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