sexta-feira, julho 13, 2007

Preservativos Com Sabor a Sardinha

Úrsula pretende preservativos com sabor a sardinha. Seria algo que identificaria uma verdadeira brochista portuguesa, distinta das restantes brochistas mundiais. Com esta ideia, todo o renascimento do verdadeiro marketing português. Como cereja em cima do bolo, o sabor a sardinha subdividiria-se em dois géneros: o sabor “extra-pimento verde” e o sabor “extra-salgado”.
O sabor a morango é banal, o aroma a tutti-frutti é italiano, existem travos a maçã, laranja e chocolate verdadeiramente insatisfatórios, os restantes gostos descambam para o tropical, colando-se a uma iconografia muito abrasileirada. A puta portuguesa tem um nível superior, ufana-se Úrsula. O segredo é posicionar o putedo português no segmento de mercado de luxo. Putas finas, por outras palavras. Finas e altamente nacionalistas, estas putas de direita, putas do 28 de Maio, putas de tributo ao bom Ballet Rose. Putas com uma mensagem política subjacente.
Uns dirão que as putas são intrinsecamente políticas, sendo a política nada mais que o proxenetismo moral em estado puro. Mas isso agora não vem ao caso.
Pensando bem, Úrsula também apoia vibradores com a forma da alheira de Mirandela, strap-ons constituídos por pele de vaca alentejana curtida e Galos de Barcelos em cadeia que se assemelham a bolas chinesas para introdução vaginal e anal. Mas isso são projectos a longo-prazo. No imediato, há que concentrar no essencial e urgente. E todos sabemos o quão urgente e essencial é o broche para o sr. Doutor e para o sr. Engenheiro. É pelo broche que se começa.
“Chupa-me todo, querida”, soltava com boçalidade o sr.Doutor, no frémito da sua excitação, enquanto desapertava o nó da gravata que o estrangulava e que, embora pudesse ser um elemento potenciador do êxtase, para ele só atrapalhava. O sr. Doutor era muito despachado nisto do sexo, libertava-se de qualquer pudor, era atroz e cruel, nada de carícias nem de servilismo; a puta que engolisse tudo e mais alguma coisa, palmadas no rabo dela eram pão para a sua boca, ejaculava em cheio nos olhos dela e nas notas de 20 euros com que lhe pagava, deixando-as tombar, desleixado, no chão, para que ela as apanhasse como se tratassem de migalhas para os famintos; e lá estava a puta, submissa e humilhada, recolhendo as notas sujas de sémen e limpando-as ao seu corpo, que bem que sabia a ele a humilhação dela, subjugado que ele era durante a sua vida profissional por outros doutores, menos perversos mas muito mais práticos do que ele. Úrsula era um tubo de escape humano, um objecto tornado bode expiatório, uma forma de terapia. Desde que continuassem a pagar bem, ela podia ser ainda qualquer coisa mais. Úrsula adapta-se facilmente às circunstâncias e todos sabemos o quão reconhecido é esse atributo nos dias difíceis que hoje correm. Ela é uma puta da vanguarda.
Úrsula chupa de forma semi-automática, cá vai disto, mais pénis, menos pénis, é só um bocado de pele musculada tensa, bah!, há quem chupe rebuçados com sabores execráveis e pague por isso. Ela era bem paga, chupava isso e muito mais. Este sabor concreto da pele não é dos melhores, o doutor nem sequer se lavava com muita assiduidade dada a intensidade da agenda… ah!, a agenda… e sabores a fruta infantilizam demais aquilo que se quer um acto, digamos, com alguma maturidade – se é que podemos considerar a libertação de todas as tensões interiores sob a forma de sexo algo realmente maduro.
E então, veio-lhe esta ideia revolucionária, antes de ele se vir sobre ela.
Porquê sardinhas? Podia ser cozido à portuguesa, ou mesmo sabor a migas, talvez um preservativo com sabor a bacalhau. Mas da sardinha é que Úrsula gosta. A sardinha, no seu esplendor, traduz todo o zeitgeist português: pequenino e gordinho. É impossível resistir ao chamamento da sardinha, ou recusar um convite para um rodízio de sardinhas estival (“a sardinhada”), uma forma peculiar de convívio dos portugueses. Lá pelo Santo António, Úrsula devorava umas quantas sobre uma fatia de pão, bebia um vinhito a martelo e lá ia ela, brochar clientes durante toda a noite em Santos-o-Velho ou Campolide, tanto lhe fazia, já conhecia todas as marchas de trás para a frente. Ela abandonava o seu mercado aristocrático durante uma noite e entregava-se ao povo, dizendo “que se lixe, já que vim aqui para a sardinha, fico aqui para o broche – e ganho uns cobres chupando as pixas do proletariado”.
Esta ideia havia de pegar, acreditava Úrsula. Um preservativo com código de barras 560, sabor a sardinha. Um ícone nacional, rivalizando lado a lado com os Pastéis de Tentúgal e com as Tortas de Azeitão.
E Úrsula foi oferecer os seus serviços ao industrial que produz os preservativos, que por acaso até era gay, mas que aceitou que ela lhe penetrasse com um forte vibrador enquanto cantarolava músicas românticas do João Pedro Pais. Ela vendeu-lhe a ideia, o tempo e a sua qualidade artística, naquilo que foi uma noite bem passada e diferente das habituais. O industrial ficou de pensar, depois de acarinhar o seu rabiosque com pó e talco.
Pensou-se, num primeiro esboço de design para o pacote, fazer um pénis em forma de sardinha na embalagem, com um gorro vermelho e verde com um escudo armilar no meio a servir do preservativo que iria envolver a sardinha. Isto de modo a apelar ao patriotismo dos consumidores. Mas isto são cogitações. Para já, ficou equacionado o primeiro estudo de mercado. Algumas putas de jornal serão contactadas brevemente para testar o referido protótipo de látex português. Úrsula não é ursa – já garantiu 10% do total de receitas de eventuais vendas futuras.

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